domingo, 15 de julho de 2012

AMIGOS, MAS NÃO PARA SEMPRE



Em Uganda, no coração da África, os contadores de histórias dizem que, antigamente, o gato e o rato viviam juntos e eram muito amigos.
Os dois parceiros plantavam, colhiam, armazenavam o produto do seu trabalho e pequenos celeiros de barro cobertos com palhas.
Um dia, o rato resolveu que devia guardar o leite também, da mesma forma que os homens faziam para não passar fome durante a estação da seca.
- De que jeito? - questionou o gato - em poucos dias o leite estará azedo.
- Deixe comigo – respondeu o rato – Eu aprendi como as mulheres preparam uma manteiga que eu adoro, a qual elas chamam de ghee.
Então, sob o comando do rato, os dois amigos deram início ao longo processo. Assim que acabavam de ordenhar as vacas, de chifres enormes, punham o leite numa sacola de couro, durante alguns dias, para fermentar. Depois balançavam a bolsa, pendurada por uma corda no galho de uma árvore, para lá e para cá. Em seguida, retiravam a espuma que ia formando-se no topo , colocavam-na em uma panela e ferviam até que a manteiga ficasse no ponto.
No fim da estação da colheita, os compadres tinham um pote cheio de ghee. Para que o gosto ficasse melhor, adicionaram neles uma série de temperos. Mas ainda havia um problema para resolver.
- Onde vamos guardar o ghee? – perguntou o gato – Tem que ser num lugar seguro, pois não confio muito em você – falou o felino, olhando com desconfiança para o amigo. – Conheço bem as suas fraquezas.
- Você tem razão. O simples cheiro do ghee me deixa com água na boca. Vai ser difícil resistir – conformou-se o rato.
- Pra ser sincero, o ghee não estaria a salvo comigo também – replicou o gato – alisando os bigodes.
Depois de uma longa discussão, concordaram que o melhor lugar para esconder o ghee seria no interior de uma velha igreja, construída pelos missionários europeus.
- O templo é um lugar tão sagrado como as árvores cultuadas pelos povos que habitam as florestas. Ninguém vai ter coragem de mexer ali – opinou o rato.
- É mesmo – apoiou o gato – Além disso o ghee ficará protegido contra a ação de insetos e vermes.
À noite, protegidos pela escuridão, o gato e o rato esconderam o pote cheio de ghee num canto da sacristia, onde o pastor guardava os documentos da igreja.
Quando a estação das secas chegou, o gato e o rato se alimentaram com os alimentos que armazenaram nos celeiros. Havia bastante comida para os dois. Mas o rato não parava de pensar no ghee que eles ocultaram na igreja.
- Será que não estragou? Como é que deve estar o gosto agora? – pensava o pequeno roedor.
Morrendo de vontade de provar um pouquinho do ghee, ele planejou uma boa desculpa:
- Tenho de ir à igreja. A filha da minha irmã vai ser batizada e ela pediu que eu fosse o padrinho.
- Está bem – disse o gato, sem desconfiar de nada.
O rato, tão logo chegou na igreja, pegou o pote, destampou-o e começou a comer.
- Ai que delícia – elogiava, com a boca toda lambuzada de manteiga.
Antes de sair, cobriu a vasilha de barro e guardou-a cuidadosamente no mesmo lugar.
- Como foi a festa? – perguntou o gato, assim que o rato retornou com uma cara toda satisfeita.
- Foi ótima.
- Qual o nome que deram para o filho da sua irmã?
- Quase cheio, respondeu o roedor, lembrando-se de como havia deixado o pote.
Dias depois, convencido de que o gato era mais fácil de enganar do que imaginavam, resolveu provar mais um pouco de ghee.
- Fui convidado para outro batizado – mentiu ele.
Na volta, com a barriga estufada, disse que o nome do recém-batizado tinha sido Metade.
- Que nomes estranhos a sua família dá aos filhotes – comentou o gato, sem perceber que estava sendo passado para trás.
O rato decidiu continuar com suas incursões até que o ghee acabasse. Ele, sempre que voltava da igreja, inventava nomes novos para os parentes batizados, de acordo com o conteúdo do pote, que ia diminuindo a cada visita. O último nome, lógico, só podia ser Vazio.
Quando a comida estocada nos celeiros acabou, o gato chamou o rato e disse:
- Agora podemos pegar o ghee que estocamos na igreja.
- Sinto muito, mas não posso acompanhá-lo, estou me sentindo mal – desculpou-se o rato.
Então o gato foi até o templo sozinho. Quando ele abriu o pote levou o maior susto.
- O quê? Não tem nada! – esbravejou – Isso não pode ser verdade – lamentou-se o bichano, rolando de raiva pelo chão.
Quando o gato chegou em casa, pronto para dar a má notícia, descobriu que o rato havia feito a trouxa e desaparecido no meio da floresta.
- Só pode ter sido este traidor! Agora entendo os nomes esquisitos que ele ia inventando: Quase Cheio, Metade, Um Pouco, Pouquinho, Vazio...
Desde esse dia, o gato vive à procura do rato. Mas o roedor, assim que escuta o miado do implacável perseguidor, foge correndo para sua toca.

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